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quarta-feira, 11 de abril de 2012

À Caminho do eu-puro



"Aqueles que acreditam que crêem em Deus, mas sem paixão em seu coração, sem angústia mental, sem incertezas, sem dúvidas, e às vezes até mesmo sem desespero, crêem apenas na idéia de Deus, mas não no próprio Deus." 
(Miguel de Unanuno, 1864-1937, do livro O Sentido Trágico da Vida nos Homens e nas Nações).

Promessas de salvação surgem de experiências humanas, em circunstâncias extremas, brotando através de esperanças de redenção, culminando eclodir no caminho da Cruz: apoteose da consolidação dos tempos por meio de um homem: o "Filho do Homem". Mas o caminho da Cruz não dá prioridades para realização de desejos naturais, tampouco se dobra a instintos demasiado humanos!
Existe um abismo divisório, que se posiciona entre o cristianismo religioso e a espiritualidade cristã. Tal abismo pode ser visto, ou até mesmo vivenciado no uso dos Salmos, com ressonâncias nas experiências humanas (por exemplo confusão, raiva, medo, ansiedade, depressão, alegria incontida). sua aderência na alma humana impulsiona a extinção do fingimento cotidiano, contrariando o positivismo utópico de que "vivemos no melhor dos mundos".* 
Quem ousa percorrer esse Caminho apropria-se de uma fé corajosa, que é ambientada por enfrentamento de mundo como ele é. Tal caminhada nos move abandonar toda a ostentação febril, as sutilezas do fogo fátuo, do engenhoso conforto, das enganosas aparências. Os Salmos também nos inspira refletir que, em se tratando de espiritualidades, não há restrições quando invocamos o Deus Vivo, quando nos achegamos diante do Seu assombroso pulsar em nossa alma. Esse pulsar que tende desconstruir ranços adquiridos pelo caminho, abandonando resquícios de subserviência instintiva e narcísica. 
O irônico disso é que a vida moderna impõe momentos de fé voltados ao "pensamento positivo", pautado em oráculos ou gurus modernos da administração, travestidos com roupagem pseudo-angelical. Enquanto que o caminho da fé espiritual é bem distinto. 
Mas o comportamento religioso tem se tornado uma negação à realidade; deuses são recriados a partir de redemoinhos de vaidades, de desejos e ansiedades interiores. No âmago das vivências corriqueiras, há uma ordem apelando para a realização de desejos. 
Diante de tais comportamentos, Marx viu deus funcionando para os religiosos como um comprimido enorme contra a dor (o equivalente moderno do seu ópio); para Freud esse deus dos religiosos oscilava entre um gigante ursinho de pelúcia e um despótico diretor de escola. Esses dois homens receberam notoriedade como protagonistas de uma nova era, com proposta libertadora através da ciência; embora Freud tornou-se cada vez mais pessimista em relação ao futuro da humanidade, talvez por ter vivido até a Grande Guerra e presenciado uma era nazista. Contudo, ambos consideraram a religião como um obstáculo ao seu programa de libertação humana, porque ela ocultava as origens causadoras das aflições humanas.
Sabe-se que em cada um dos casos acima a tradição profética da Bíblia parece ter sido a motivação inconsciente deles, mediante as tentativas de transformar a consciência coletiva. A crença num destino mais elevado para a humanidade, o conceito da alienação humana, a noção (em Marx) de haver propósito na história e o triunfo final da justiça... Tudo isso são reminiscências de uma cultura que, em algum momento, se achava profundamente influenciada por uma visão bíblica de mundo. Deste modo, Marx se utilizou do argumento de Feuerbach, crendo que a crítica à religião é o fundamento para toda crítica social, de modo a pôr luz sob toda e qualquer possibilidade de inversão de valores sociais causados pela religião. Feuerbach dizia que: "Para enriquecer a Deus, o homem tem que se tornar pobre; para que Deus seja tudo, o homem tem que ser nada.” Neste detalhe, podemos lembrar de um conceito nietzschiano de que o niilismo positivo (ou reativo) pode levar a humanidade para a superação de si mesma, através da dissolução dos valores pré-estabelecidos, e o surgimento de uma responsabilidade individual para com os efeitos da dissolução (antivalor). 
Nós nunca compreenderemos Nietzsche se não considerarmos que ele foi criado num ambiente judaico-cristão, sobretudo, protestante, e que nas primeiras experiências, sua vida era pautada numa visão moral e estética, onde os seus valores frequentemente eram, mesmo de forma inconsciente para ele, bíblicos. A característica linguagem de redenção humana: o “Novo Homem”, é tomada diretamente da teologia cristã.
Mediante inclinações semelhantes às de Nietzsche, o jovem Marx também vivenciou a religiosidade judaico-cristã e não se sentiu muito à vontade para levá-la a sério, apesar de uma breve fagulha expressa: "A união com Cristo consiste na mais íntima comunicação com ele, tendo-o diante de nossos olhos e em nosso coração, e sendo assim tomados pelo mais elevado amor por ele, ao mesmo tempo em que voltamos o nosso coração aos nossos irmãos, com os quais ele nos ligou, e por quem ele também se sacrificou..." (Karl Marx, aos 17 anos de idade, no ensaio: A união dos crentes com Cristo de acordo com João 15:1 - 14).
Nesse ensaio Marx tomou como base o que um dos pais da igreja, João Crisóstomo (c. de 377-407), corajosamente argumentou aos nobres de Milão: "Isso também é roubo, não dar aos outros o que se possui. Talvez esta afirmativa soe surpreendente para você, mas não se surpreenda... Assim como um oficial no tesouro estatal, se ele negligencia em distribuir para quem lhe tenha sido ordenado, mas retém para si por sua própria indolência, tem que sofrer a pena, sendo posto à morte, da mesma forma o rico é como um mordomo do dinheiro que possui para ser distribuído aos pobres. Ele é dirigido a distribuí-lo a seus servos que estejam em necessidade. Desse modo, se ele gastar consigo mesmo mais do que sejam suas necessidades, ele terá que pagar a mais dura pena depois. Pois os seus bens não são propriedade sua, mas pertencem a seus servos... Rogo que você se lembre disso sem falta, que não compartilhar os bens com os pobres é roubar os pobres e privá-los de seu meio de vida; nós não possuímos nossos bens, mas sim os deles. (João Crisóstomo, Sobre a Riqueza e a Pobreza).
Semelhantemente o grande Pai da Capadócia, Basílio da Cesaréia (c. de 329 - c. de 379) repreendeu cristãos que eram ricos com uma linguagem que é ouvida com maior frequência nos piquetes das fábricas do que em templos religiosos: "O pão que você guarda consigo pertence ao faminto; o agasalho que você deixa dentro do seu armário, ao desnudo; os sapatos que você possui e que estão apodrecendo, ao que está descalço; o ouro que você tem muito bem guardado, ao necessitado. Portanto, todas as vezes em qeu você teve condições de ajudar alguém, e recusou-se a isso, você então lhes fez um mal". (Basílio da Cesaréia, em discurso proferido em Ávila).
C. S. Lewis foi muito feliz em seu comentário: "Fale comigo sobre a verdade da religião, e vou ouvi-lo com alegria. Fale comigo sobre o dever que a religião impõe, e vou ouvi-lo com submissão. Mas não me venha falar sobre as consolações da religião que vou achar que você está por fora." (C. S. Lewis, em Um Pesar Observado).
Quando encontramos oportunidade de falar ao próximo, devemos discernir o que o coração do próximo almeja escutar, ou seja, focar no que o próximo necessita e não o que o nosso ego ou moralidade tem a dizer.
Há nítido entorpecimento que tenta desviar nossos passos em direção ao caminho da cruz sob uma sutil presunção, talvez errônea, sobre o que significa santidade e espiritualidade. Contudo, o Espírito ainda teima admoestar: "A verdadeira religião pura e sem mácula, para com o nosso Deus e Pai, é esta: visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações e a si mesmo guardar-se incontaminado do mundo" (Tiago 1:27).
Acredita-se que a grande luta de Sócrates, na Grécia Antiga, tenha sido contra os sofistas: aqueles que tinham por princípio comercializar o conhecimento, persuadindo a sociedade comprar suas ideias, mesmo que despojadas de sabedoria. Porém, a sabedoria nada mais é do que o conhecimento compartilhado, e útil para a edificação e construção do pensamento.
O vácuo criado pela perda da criação artística e da experiência responsiva é preenchido ultimamente no mundo moderno. O secundário tornou-se o nosso narcótico. A humanidade alfabetizada é assolada diariamente por milhões de palavras impressas, transmitidas pelo rádio e vistas nas telas de TV com respeito a livros que ela nunca vai abrir, sobre músicas que não vai ouvir, sobre obras de arte que nunca vai contemplar. Um zumbido perpétuo de comentários estéticos, de julgamentos precipitados, de expressões pomposas pré-fabricadas preenche-nos o ar. Presumivelmente, a maior parte de toda fala artística ou reportagem literária é apenas lida por alto e não propriamente lida, mas é ouvida, porém sem se prestar a atenção... Como sonâmbulos, somos guardados pelo sussurro entorpecente do jornalístico, do teórico, em relação ao frequentemente estridente e imperioso fulgor de uma completa presença" (STEINER diz no livro: Presenças Reais: Há Alguma Coisa no Que Dizemos?)
Quando o assunto é a Beleza da Soberania e da Sabedoria divina, a coisa fica um tanto mais confusa, para alguns que imaginam um deus a serviço da criação, um deus de saia, como disse o cantor Cazuza na música "Cobaias de Deus". O sofrimento cristaliza, como nada mais, os dilemas e os pesadelos de uma vida sem Deus. É um nervo inflamado que, se tocado, desperta uivos de raiva e angústia, especialmente hoje em dia. 
Certamente, quando nossos órgãos são transplantáveis; quando temos como comer sem engordar, copular sem procriar, dar um brilhante sorriso sem estar feliz; certamente o sofrimento deveria ter sido banido de nossa vida. Ter que continuar a sofrer, e ver outros sofrendo, isso para nós é uma afronta; e a divindade que, tendo o poder de interromper o sofrimento, ainda permite que seja contínuo, essa divindade só pode ser monstruosa, não um Deus amoroso. É o mesmo de quando um equipamento emperra e fica com defeito, nós procuramos pelo fabricante ou o mecânico para xingar. Aos olhos daqueles que veem os homens como máquinas, Deus é o fabricante, e o mecânico é o seu sacerdote." (adaptado de M. Muggeridge, em Algo Belo para Deus).
Como muito bem disse o teólogo e filósofo Emil Brunner no seu artigo "O homem revoltado": Em cada civilização, em cada período da história, é verdade dizer: Mostrem-me o tipo de deus que vocês têm, e eu lhes direi que tipo de humanidade vocês possuem.
Com a finalidade de ressaltar este pensamento, podemos apropriar do que disse o jovem poeta inglês Thomas Thraherne (1637-1674): - "até que o mar flua em suas veias, até que você se revista dos céus, e seja coroado com as estrelas; e perceba que você é o único herdeiro de todo o mundo; e, mais do que isso, porque todos os homens são igualmente esse único herdeiro, tal como você. Você não poderá usufruir do mundo até que você cante e alegre-se e tenha o prazer em DEUS, tal como os avarentos se alegram com o ouro, e os reis com o cetro." Esse pensamento nos ajuda impedir decairmos para a adoração do mundo em si, explorá-lo para nossos próprios fins egoístas, como o fazem religiosos proselitistas e ambiciosos cujas mentes já foram entorpecidas pelo poder.
Devemos ter em mente que não foram os pecadores, mas os “religiosos” e os “donos do poder” quem rejeitaram o Salvador. Assim, o escritor bíblico relatou para que “saiamos, pois a ele, fora do arraial, levando o seu vitupério. Na verdade, não temos aqui cidade permanente, mas buscamos a que há de vir” (Epístola aos Hebreus 13:13-14). Os discípulos de Jesus são chamados para ir onde Jesus está
Há muito tempo atrás, um homem de conduta religiosa permitiu-se desconstruir, colocar em ruínas os rudimentos e falsa espiritualidade, outrora enxertados nele através de uma sociedade hipócrita, movida por barganhas. Ele dizia assim: "Bem sei que tudo podes, e nenhum dos teus planos pode ser frustrado... Eu te conhecia só de ouvir, mas agora os meus olhos te vêem. Por isso, me abomino e me arrependo no pó e na cinza (livro de Jó 42:2, 5-6). Quando há espaço para desconstruções, há ruptura entre o eu-si e o eu-nós, possibilitando enxergar Naquele em que tudo e a todos criou, uma possibilidade de vida plena. 
Foi o que Emerson tentou ressaltar nos seus ensaios, foi o que Zamyathin traduziu na sua ilustre e inédita obra “Nós”. Foi o que tantos outsiders (o pregador George Fox, Walt Whitman, David Henry Thoreau, o visionário T.S. Eliot, Dostoievsky, Pasternak, alguns poetas e escritores da geração beat, por exemplo) tentaram expressar à humanidade. Com seus uivos eletrizantes proferiram a uma geração monótona e confortavelmente hipócrita e perversa, cujas consciências estavam já entorpecidas, entranhadas em seus vãos deleites, cegos e estúpidos.
É próprio da dominação hipócrita laçar seus tentáculos para além das cercanias, um movimento a um só tempo de expansão e dependência. Representa, ao nível comunitário, o protótipo da exploração do homem pelo homem. A tentativa em reconquistar o domínio perdido, entregue ao adversário, no Jardim do Eden. Enquanto isso, o outsider vê esta tragédia por outros ângulos, busca outro raciocínio, outra visão, outra conduta.
A vontade de potência (ou domínio) não é uma expressão qualquer. Realiza-se sempre às expensas de alguma vítima, seja os que exercem o poder, ou os que cegamente consentem na dominação, um vínculo sádico de dependência. Até aí, tudo bastante simples. Entretanto, insólitos são os caminhos de uma psicologia prolongadamente silenciada: com o passar do tempo (o tempo é fundamental) observa-se no colonizado um esmaecimento da revolta, chegando quase sempre a uma submissão voluntária e algumas vezes até a uma docilidade pervertida. A exploração evoca sensualidade, a opressão ternura. A vítima passa verdadeiramente a amar o dominador, a depender dele; renuncia de bom grado a sua consciência reflexiva; abandona sem hesitação as suas aspirações, norteando seu procedimento conforme os ideais de seu dominador: o que cabe fazer, como deve pensar, o que deve desejar (um exemplo é o selvagem, personagem do livro Admirável Mundo Novo, de Huxley). Do ato de obediência às normas dominadoras extrai intensa sensação de proteção (cobertura) e de bem-estar, podendo, tranquilo de consciência, dormir um ano sem as culpas e os remorsos das desobediências. A “boa consciência” é o bem supremo da mente colonizada e uma vez estabelecida completa-se o processo imperialista de colonização, estabilizando-se as primeiras instabilidades. Estabelece-se assim um vínculo masoquista de dependência no colonizado, e pelas mesmas razões, só que invertidas às do imperialista, poderemos também dizer que todo o colonizado é um “drogado”.
Dependendo do colonialista, desta dependência extrai o prazer, desse prazer extrai o orgulho, com este orgulho nega sistematicamente os efeitos sinistros dessa dependência sobre seu corpo existencial.
Podemos então concluir que todo o universo colonialista está caracterizado pela inevitável “narcotização” de seus participantes, sejam eles colonizados ou colonizadores. Se para o colonizador as “drogas” são as regalias evidentes do processo, pra os colonizados as “drogas” são os privilégios do infantilismo psicológico.
A dialética colonialista vem associada, originalmente, à exploração entre nações; mas pode, por extensão, aplicar-se às relações de exploração dentro de um país, de uma cidade, de uma corporação, de uma religiosidade, de uma família e, mesmo, de uma personalidade.
Evitando uma possível reação por parte do colonizado, tenta-se mascarar a realidade, encobrindo as evidências, confundindo a verdade. Podemos dizer que a propaganda ideológica polui consciências, envenenando o conhecimento.
Deste modo, uma mesma produção cultural que num lugar ou numa época possa funcionar como agente de libertação e desalienação de consciências pode, noutro lugar ou noutra época, funcionar como um agente do entorpecimento e da alienação das consciências.
Alienação que justificaria o fato do homem submeter-se à escravidão. Essa capacidade de resistir vivo, mesmo como escravo, não pode ser explicada sem se recorrer ao poder da fé, do qual o poder do amor seria apenas uma subsidiária ou uma eventual encarnação.
Já foi dito que o prazer obtido pelos poderosos tem caráter sadomasoquista. Mas, como é sentido e vivido, esse tipo de prazer pode ser realmente considerado felicidade? Refiro-me à felicidade como fruto da apropriação indébita e da expropriação autorizada e impune, como aquela do ladrão que rouba de ladrão.
Para que o homem se permita substituir o prazer de viver pelo poder de ter, algo aconteceu antes em sua fisiologia e em sua psicologia natural e espontânea.
Para alguns, o prazer de viver pode ser traduzido por AMOR. Mas o que é amar, além daquilo que é explicado pela fisiologia e a biologia? Sente-se por ele, precisa-se dele, delicia-se nele, acaba-se por ele, morre-se por ele, mata-se por ele, enfim, mas não se sabe o que, de fato, é "ele"?
Será sempre catastrófico o resultado da utilização do amor a serviço do poder, seja autônomo, religioso ou político, porque manipulado dessa forma vai ocorrer, inevitavelmente, a destruição do próprio amor. Só a liberdade, a autonomia e a verdade nos ensinam a aceitar biologicamente e humanamente o tempo, o espaço e o amor pelas coisas vivas.
Assim, para pessoas “drogadas”, a esperança de vir um dia a ser feliz transforma-se, para eles, numa espécie de dependência narcótica. Essa dependência, pelo menos, os mantém aparentemente vivos, embora sem amor espontâneo algum, quer dizer, mortos, mas ainda “insepultos”, como diz nas escrituras: “Deixai os mortos sepultar os seus mortos” (Bíblia, Mt 8:22).
Diante do exposto, podemos considerar a ideia de que numa sociedade como tal, os mortos comandam os vivos, num processo de desvivência progressiva. Mas, paradoxalmente ainda nos cabe um recurso, o de acreditar que morremos, porém não desvivemos!
Mas é claro que as coisas não andam tão bem na aldeia. Alucinados e insaciáveis, os profetas da pseudofelicidade estão muito longe de se convencerem. Almejam a todo custo propagar a teoria da necessidade de dominação (vontade de verdade, que também pode ser definido como vontade de potência, conforme Nietzsche preconizou no seu livro Assim Falou Zaratustra), solapando a capacidade de raciocínio reacionário, dissimulando a espontaneidade de se amar.
A alegria de se amar está no modo simples e direto e gostoso de se expressar, no âmbito funcional, espiritual, físico, emocional, psicológico, afetivo, sensual, ético e ideológico. Como tal, deve ser, por natureza, sempre lábil, instável e furtiva, como acontece com as coisas que não existem por si próprias.
E isto provém do Espírito da alegria, coisa tão incerta como o vento, que é tão forte que às vezes vira tufão, outras parece brisa suave, que pode vir do sul ou do norte, do leste ou do oeste, mas que vem, queiramos ou não, do Criador, e na hora que bem entender.
É amor espontâneo, é a vida numa pulsação, com a qual o ser vivo expressa sua existência. Quando nos desprendemos, há compartilhamento de experiências e ideias, há grandes chances de se produzir saberes, vivências que se entrecruzam, entronizando aromas agradáveis na alma. Jesus Cristo abriu caminho para esse compartilhar. E, séculos mais tarde, um pensador russo alertou que "a felicidade só é real quando compartilhada".** 

* Alusão à crítica de Voltaire, contida no livro "Candido ou O Otimismo".
** Alusão ao escritor russo Liev Tolstoi.