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sexta-feira, 21 de outubro de 2011

O drama do outsider

Na sua peregrinação involuntária, na busca da compreensão de seus dilemas interiores e diante da necessidade de se expressar, no seu mais puro estado de nitidez existencial, o "outsider" procura meios para inserir-se no "habitat comum". Torna-se outsider, não por vontade própria, mas por causa de suas convicções não coincidirem com a tradição vigente em sua época.
O que caracteriza o procedimento do outsider é a transitoriedade de suas percepções, sua mobilidade na busca do essencial, ou seja, o esforço de quebrar limitações do imaginado e do metafísico; uma inquietude contrapondo-se a ordem pré-estabelecida e de caráter autoritário. O outsider não consegue se "sujeitar voluntariamente" à uma instituição de poder; há conflitos interiores que teimam desenganar (e também desencantar) sua percepção, eliminando quaisquer possibilidades de fingir submissão a algo que não lhe satisfaz a consciência; a necessidade de "ser", contrariando o esforço do "ter"; contrariando também propostas de predestinação, fogindo para a busca do "imanentismo" repentino e fragmentário, não sugestionável, tapando os ouvidos para vozes que outrora lhe sugeriria a obediência inevitável ao sistema de tradições humanas. Daí sua queda ao "intangível", o "perder-se" no descontrole inevitável, a imaleabilidade da alma (a peregrinação, a fugacidade em busca da fé como uma exigência para profundas necessidades do seu íntimo), e não meramente uma graça provinda do sobrenatural como dádiva de mão única.
Entender o outsider é de uma complexidade sem tamanho, é adentrar em um mar revoltoso cujas ondas nos lançam no paradoxo das questões do "imaterial", da hiper-realidade.
E isto é expressado em todas as direções. Não há uma distinção, mas ocorre nas diversas esferas antropológicas (social, política, religiosa, cultural, etc). Tem  mais correlação com o "Caminho", e não com o ponto de partida, muito menos com a chegada.

Transcrevo aqui a letra de uma canção que bem expressa algumas das características:
(Essa vai para o amigo James Vidal, o "avohai")

Canção Agalopada


Zé Ramalho

Foi um tempo que o tempo não esquece
Que os trovões eram roncos de se ouvir
Todo o céu começou a se abrir
Numa fenda de fogo que aparece
O poeta inicia sua prece
Ponteando em cordas e lamentos
Escrevendo seus novos mandamentos
Na fronteira de um mundo alucinado
Cavalgando em martelo agalopado
E viajando com loucos pensamentos
Sete botas pisaram no telhado
Sete léguas comeram-se assim
Sete quedas de lava e de marfim
Sete copos de sangue derramado
Sete facas de fio amolado
Sete olhos atentos encerrei
Sete vezes eu me ajoelhei
Na presença de um ser iluminado
Como um cego fiquei tão ofuscado
Ante o brilho dos olhos que olhei
Pode ser que ninguém me compreenda
Quando digo que sou visionário

Pode a bíblia ser um dicionário
Pode tudo ser uma refazenda
Mas a mente talvez não me atenda
Se eu quiser novamente retornar
Para o mundo de leis me obrigar
A lutar pelo erro do engano
Eu prefiro um galope soberano
À loucura do mundo me entregar